Residência Artística – Sandra Sato

A proposta inicial desta ação experimental consistia em convidar um(a) artista para criar e desenvolver uma obra com nossos estudantes. Naquele momento, achamos importante delimitar que o trabalho tivesse culminância na Mostra Cultural, de forma que fossem expostos os processos de criação e seus resultados.

A primeira colaboração realizada foi em 2017 com Sandra Sato, que é artista e professora do Instituto de Artes e Design da UFJF. Sua proposta foi lançada para os estudantes do 3o. ano do Ensino Médio, durante uma aula de Artes Visuais com as três turmas. A partir disso, cada estudante decidiu se queria participar da ação ou não.

Sandra Sato e bolsistas conversam com turma do 3o. ano do Ensino Médio no CAp. João XXIII



Ao longo dos meses de junho, julho, agosto e setembro foram realizados encontros semanais, nos quais foram elaborados trabalhos artísticos decididos coletivamente em torno de um tema: a maçã. A vivência dentro da escola gerou uma exposição que ocorreu no Hall do CAp. João XXIII de 18 a 29 de setembro de 2017. Sandra, o grupo de estudantes do Colégio e o grupo de bolsistas que acompanharam as ações encaminharam a proposta de instalação. No texto de abertura, vemos um pouco do resumo da proposta:



Sandra Sato ainda destacaria os seguintes pontos:

“Ao receber o convite para a Residência Artística no Colégio de Aplicação João XXIII, além da gratidão, fiquei apreensiva pela responsabilidade e pela missão de vivenciar o processo de produção artística pensando fora da caixa.

A ideia de uma produção coletiva partiu do desejo de realizar um trabalho de concepção, pesquisa e produção prática do qual pudéssemos obter também respostas educativas, modificando o cotidiano de alunos, professores, funcionários do colégio e bolsistas do curso de graduação do Instituto de Artes e Design (IAD) da UFJF, onde sou professora.

A maçã como tema principal surgiu a partir do trabalho de grafite que cobre os muros da entrada do colégio, onde a fruta brilha como uma das únicas referências vivas entre os símbolos do cotidiano escolar. Nela, vi possibilidades de interação das artes plásticas com outras ciências, distribuídas em disciplinas que aprendemos nas salas de aula: a maçã na Lei da Gravidade de Newton; na tecnologia dos computadores; na literatura infantil de Branca de Neve; na música do selo dos Beatles; no paraíso da Bíblia; no rosado das faces das musas dos poetas e pintores…

Como esperado, poucos estudantes puderam atender ao convite de participar da aventura de produzir arte para o já consolidado projeto Arte em Trânsito – um terreno rico em ideias e pioneiro no rompimento das fronteiras do ensino escolar das artes. Primeiro, porque a sugestão foi recrutar voluntários sem a obrigação das chamadas, das notas e outras formalidades a que estamos condicionados a atender. Segundo, para refrescar minha memória de que os estudantes trazem em suas agendas muito mais compromissos do que na minha época. Mas isso foi, de certa forma, um ganho, pois uma equipe reduzida possibilitou encontros regulares e de rendimento intenso, tanto nas discussões quanto na produção plástica.

Sair do espaço convencional de ateliê para pensar e produzir em um ambiente escolar foi desafiador, mas em mim converteu-se no enlace dos dois papéis que desempenho tendo a arte como idioma: a produção e o ensino. Se, na vida prática, somos conduzidos a compartimentalizar nossas ações burocraticamente, aqui pude reunir os dois caminhos. O trabalho coletivo foi gratificante e predominou a colaboração acima do conflito de ideias.

Desta convivência semanal de três meses resultaram estes experimentos plásticos aqui expostos. Todos trazem as particularidades, os sentimentos e valores de cada autor, combinados em cada peça apresentada. Assinamos juntos, como produzimos juntos.

Saímos desta experiência amadurecidos, satisfeitos quanto a expectativa de crescer no trabalho educativo e artístico como cidadãos e profissionais aprimorados e enriquecidos. E já colhemos os frutos na forma de futuras publicações e relatos em eventos científicos e artísticos. Saímos testemunhas de que os espaços tidos como “não-convencionais” para a produção de arte – sejam eles escolas ou não – podem adotar essas práticas com sucesso.

Agradeço, de coração, pela confiança e reconhecimento expressos no convite do projeto Arte em Trânsito, personificado na professora e pesquisadora Renata Caetano e amparado pela administração e equipe do Colégio de Aplicação João XXIII. E aplaudo, com entusiasmo, essa iniciativa. Que já faz história e é modelo para que os educadores deste país se sintam estimulados a pensarem fora da caixa.

Com maçãs, com arte ou com qualquer outra forma de saber”.

A exposição se dividiu na apresentação do exercício experimental de construção de objetos inspirados na forma da maçã utilizando materiais recicláveis. Essa parede era composta por uma sequência de imagens de um exercícios fotográficos desses objetos inseridos no cotidiano escolar.



Em outra parede apresentamos uma grande imagem da obra “O Filho do Homem”, famoso autorretrato de René Magritte pintado em 1964. Nele, vemos um homem de casaco e chapéu, mas seu rosto é curiosamente encoberto por uma maçã. A imagem inquietante surgiu em uma das primeiras conversas de Sandra com os estudantes e virou um símbolo de nosso trabalho. Ela foi lida a partir de nossas próprias experiências com a maçã e serviu como base para uma espécie de mosaico composto por todas as imagens de nosso processo de criação.

Manipulação digital da obra “O Filho do Homem”, construída com imagens de todo o processo de trabalho de Sandra Sato com nossos estudantes. A impressão foi exposta durante a 6a. Mostra Cultural Arte em Trânsito em setembro de 2017.



Nessa parede também apresentamos uma sequência de fotografias sobre a visita ao atelier de cerâmica do IAD com as estudantes que participaram da proposta. Nessa ocasião, criamos maçãs híbridas de argila, a partir de um debate que tivemos sobre o uso excessivo de agrotóxicos nessa fruta.



Essas maçãs compuseram uma obra que chamamos de “Campo Minado”. Tratava-se de um retângulo de madeira de 150 x 150 cm. Dentro dele havia muita areia e as maçãs híbridas de cerâmica. A reflexão proposta nesta obra girava em torno de duas perguntas: Quanta verdade ainda reside na frase “é bom para a saúde”? Quantos e quais são os campos minados que temos que atravessar diariamente, a que temos que sobreviver, para seguirmos caminhando?

“Campo Minado” exposto durante a 6a. Mostra Cultural Arte em Trânsito em setembro de 2017.



Para além disso, houve ainda uma proposta interativa, na qual as maçãs produzidas artesanalmente na primeira oficina da artista com o grupo foram deixadas estrategicamente nos espaços do colégio com a seguinte mensagem “leve-me para outro lugar”.

“Leve-me para outro lugar”, intervenção que aconteceu com os objetos/maçãs durante a 6a. Mostra Cultural Arte em Trânsito em setembro de 2017.



Em 2019, a proposta foi apresentada na exposição “O que pode um artista na escola?” que ocorreu no Museu de Arte Murilo Mendes. A artista revisitou a proposta por meio de uma obra que apresentava novamente uma maçã híbrida: uma metade era de cerâmica e a outra era a fruta real. Com o passar dos dias pudemos observar as transformações que ocorreram e confrontar o apodrecimento da metade real com as imagens documentais das maçãs que foram eternizadas no CAp. João XXIII.



As ações da Residência Artística vem sendo acompanhadas pelo projeto de Iniciação Científica “Residência artística na escola” criado em 2017. Para saber mais sobre o projeto visite a página:

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